Todo mundo acha a maior graça no fato de eu não matar insetos... Pegar um pernilongo com cuidado e jogá-lo pela janela é motivo de risos incrédulos. Assoprar formigas em vez de esmagá-las gera olhares de reprovação ou preocupação com meu estado mental.
"Você não está exagerando?", alguns criam coragem de perguntar - temendo que eu esteja virando uma fanática, vítima de uma lavagem cerebral que faz as pessoas perderem a noção da realidade. Principalmente por causa da minha profissão.
Admito: alguns anos atrás, eu também acharia. Para mim, era um exagero patético respeitar a vida a ponto de querer poupar as formigas. São bilhões, trilhões, infinitilhões - que dano traria ao mundo destruir um formigueiro? Ainda mais um construído no lugar errado, afinal, a parede da cozinha não é o habitat natural desse povo.
É evidente que mudei de idéia. Formigas e baratas podem não valer nada para a gente, mas a vida delas tem muito valor - para elas mesmas. Toda forma de vida, por mais rudimentar que seja, tenta se proteger, se preservar. Toda vida tem mecanismos de defesa. Depois que a gente se acostuma a não matar formigase outros seres, passa a achar estranhoo comportamento contrário - o solene desprezo ou desatenção pela vida deles.
Mas o que fazer quando esses pequeninos seres ameaçam a saúde ou prejudicam o conforto dos humanos? Quando cupins devoram seus móveis, pulgas infestam os lençóis de quem tem cachorros ou baratas passeiam pelas gavetas da cozinha?
Conheço pessoas tão radicais na preservação da vida que seriam capazes de sacrificar os móveis para não ter que matar os cupins. Mas a maioria não iria tão longe, e embora eu tenha pudores em defender o direito de matar "se for o caso", admito que em algumas situações (como essa dos cupins) eu faria... Então, qual é a diferença?
A diferença é parar para pensar. É reconhecer outra forma de vida como válida em si mesma (e não segundo a sua utilidade ou inutilidade para mim). É tentar diminuir o ímpeto aniquilador, tentar reduzir o impacto destrutivo que temos no mundo. Nós ficamos horrorizados com os grandes predadores nos documentários da TV a cabo, mas somos muito mais impiedosos.
Quer sejamos carnívoros ou vegetarianos, matamos muitos seres para nosso sustento. Plantar soja causa um estrago danado. Destroem-se florestas e cursos d'água, sacrificando passarinhos, borboletas, peixes, formigas, gafanhotos, minhocas, roedores, macacos, felinos. O mesmo vale para o algodão que nos veste. Produzimos toneladas de dejetos e detritos - somos muito mais nojentos que as baratas se pensarmos assim.
Nós humanos, matamos seres para viver, matamos porque nos ameaçam, porque são úteis ou porque nos são "inúteis". Se deixarmos de matar um pouquinho só, quando isso é absolutamente dispensável, acabamos tendo olhos mais atentos para a vida em geral, incluindo a humana.
Parece um bom motivo.
Um comentário:
Oi Belle,
não tenho coragem de falar pro meu filho matar um bichinho! Eu pego e jogo lá fora tb : )
Só não perdo mosca...
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